O acesso à Justiça é uma garantia, e os direitos fundamentais, inclusive o da igualdade, servem para todas as pessoas que estejam no Brasil, independentemente da nacionalidade. Com esse entendimento, a 2ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve decisão que reconheceu a competência da Justiça do Trabalho para julgar ação contra um diplomata brasileiro.
No processo, apresentado por um cidadão etíope que prestou serviços para embaixadas do Brasil na África e em ilhas do Caribe, o africano disse que exercia as funções de motorista e auxiliar de serviços gerais na Embaixada do Brasil na capital de seu país, Adis Abeba, onde o diplomata era o embaixador.
Depois, o etíope foi para o Rio de Janeiro, para trabalhar diretamente para o embaixador, com visto de turista, e sendo, posteriormente, contratado para acompanhá-lo na representação brasileira em São Vicente e Granadinas, no Caribe. Despedido sem justa causa, mudou-se para o Distrito Federal e pediu diferenças salariais, horas extras, aviso-prévio e outros direitos na 3ª Vara do Trabalho de Brasília.
Enquanto o etíope defendeu a competência da Justiça brasileira porque os envolvidos atualmente residem no país, o embaixador sustentou a incompetência do Judiciário trabalhista para julgar o caso, sob o argumento de que a prestação de serviço nunca ocorreu no Brasil e de que o empregado é estrangeiro. Segundo o diplomata, o motorista somente esteve no Rio de Janeiro para gozar férias e fazer tratamento ocular.
O juízo de primeiro grau julgou procedente a argumentação do diplomata. Pelo artigo 651 da CLT, a competência da Vara do Trabalho é determinada pelo local da prestação dos serviços e se estende para atender às demandas que envolvam empregados brasileiros que trabalham em agência ou filial em outra nação, desde que não haja convenção internacional dispondo o contrário (artigo 651, parágrafo 2º). Como não houve prova sobre a atividade no Brasil e o trabalhador é estrangeiro, o juiz declarou a incompetência, sem julgar o mérito da ação.
Já o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região modificou a decisão para declarar a competência e determinar o retorno do processo ao juízo de primeiro grau para continuar o julgamento, afirmando que a sentença mereceria confirmação, mas destacou que a interpretação das normas legais deve ser harmônica com as regras e os princípios constitucionais.
Para o TRT-10, a limitação prevista no artigo 651, parágrafo 2º, da CLT não condiz com os princípios constitucionais, uma vez que o acesso à Justiça é uma garantia, e os direitos fundamentais, inclusive o da igualdade, se destinam a toda pessoa que esteja no Brasil, independentemente de sua nacionalidade (artigo 5º, caput, da Constituição). Por causa da discordância entre as normas, a corte concluiu que a Constituição de 1988 não recepcionou o dispositivo da CLT. Como o diplomata tem domicílio no país, o acórdão reconheceu a competência da Justiça do Trabalho, nos termos do artigo 12 do Decreto-Lei 4.657/1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).
A relatora do processo no TST, ministra Delaíde Miranda Arantes, negou conhecimento ao Agravo do diplomata, que pretendia a análise do seu Recurso de Revista. De acordo com ela, o julgamento sobre a competência territorial foi uma decisão interlocutória, porque o juiz resolveu questão incidente, acessória aos principais pedidos. Na Justiça do Trabalho, a ministra esclareceu que não cabe Recurso de Revista imediato contra decisão interlocutória. “Há exceções previstas na Súmula 214 do TST, mas o caso em questão não se enquadra em nenhuma delas”, afirmou. A decisão foi unânime.
Com informações da Assessoria de Imprensa do TST.
Fonte: CONJUR