A morte da vereadora carioca e ativista de direitos humanos Marielle Franco parece ter abalado a confiança do campo conservador e de seus discursos de ódio em pleno ano eleitoral. Nesse sentido, o silêncio do presidenciável Jair Bolsonaro sobre o assassinato da parlamentar é significativo.
Diante da forte reação à morte de Marielle, alguns expoentes reacionários se resguardam, como fez o pré-candidato do PSL, enquanto outras figuras públicas tiveram de voltar atrás em suas declarações. Agora, resta saber se o brutal assassinato da vereadora terá influência sobre um possível recuo do discurso conservador nas eleições deste ano.
O cientista político Glauco Peres, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, afirma que o silêncio de Bolsonaro, defensor da tortura na ditadura e entusiasta da ampliação da repressão policial, diz claramente qual é sua estratégia. “Se tivesse superado as diferenças políticas e manifestado seu repúdio ao ocorrido, provavelmente descontentaria parte daqueles que o apoiam hoje”, analisa. “No entanto, preferiu voltar-se para seu eleitor, mas sem manifestar-se, evitando, assim, que os moderados que estão próximos se distanciem.”
A morte de Marielle levou milhares de pessoas às ruas e gerou incontáveis reações nas redes sociais em solidariedade à vítima e em repúdio à violência. Embora se tratasse de uma vereadora identificada com pautas caras à esquerda, essas manifestações agruparam pessoas com visões ideológicas múltiplas e até mesmo distintas.
Já as tentativas de desqualificar a parlamentar, e por consequência seu ativismo nos direitos humanos, foram expostas por suas mentiras. O deputado Alberto Fraga espalhou, no Twitter, a fake news de que Marielle tinha envolvimento com o narcotráfico. O deputado apagou as postagens após reações.
A desembargadora Marília Castro Neves, do Tribunal de Justiça do Rio, destilou seu ódio contra a vereadora ao afirmar que ela estava “engajada com bandidos” e que foi eleita “pelo Comando Vermelho”. Exposta, ela não se deu por satisfeita: pediu um “paredão profilático” para matar o deputado Jean Wyllys, também do PSOL. As declarações não passaram em branco: diversos cidadãos criticaram a magistrada, que é alvo de duas denúncias do PSOL no Conselho Nacional de Justiça.
A extensão deste constrangimento dependerá, na avaliação do cientista político, de como a morte de Marielle Franco será entendida no debate político: nas eleições, Marielle será lembrada como um símbolo do campo progressista ou um pilar de nossa instabilidade democrática?
“Tudo dependerá se a morte dela será vista como uma bandeira política utilizada por segmentos da esquerda ou se é um afronta à democracia brasileira em um âmbito mais geral. Se estivermos no primeiro caso, o embate público entre direita e esquerda permanecerá aceso e, possivelmente, sua morte será mais um elemento nesta disputa. Se observarmos o segundo caso, a possibilidade de que os discursos públicos se tornem mais moderados ganha força”, acrescenta Peres.
Fonte: Carta Capital