Enquanto o Brasil via a prisão de Lula, Henrique Meirelles e Joaquim Barbosa, sem alarde, deram passos importantes rumo a uma eventual candidatura
Por João Soares
Enquanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, líder das pesquisas eleitorais, negociava com a Polícia Federal como se daria sua prisão, Joaquim Barbosa e Henrique Meirelles deram passos importantes para concorrer ao posto ocupado por Lula durante oito anos.
Junto com outros nove ministros que saíram do governo Michel Temer, Meirelles deixou o comando da Fazenda na sexta-feira 6. A legislação eleitoral prevê que os ministros de Estado devam estar afastados de funções públicas seis meses antes da eleição caso queiram se candidatar para mandatos eletivos. Na última terça-feira 3, ele assinou a ficha de filiação ao MDB, partido do presidente da República. Desde 2011, era filiado ao PSD.
“Inicio, agora, uma nova etapa que construirei ao lado dos brasileiros que desejam bom senso, equilíbrio e competência na gestão pública. Me ofereço como um porta voz dos anseios de todos que têm consciência de que o extremismo e o populismo não levarão o Brasil a lugar nenhum”, escreveu no Twitter.
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Também na sexta-feira, acabou o prazo para filiações partidárias dos que desejam participar das eleições de outubro. Na data limite, Joaquim Barbosa se filiou ao PSB. Em sua página no Facebook, o ex-ministro do STF explicou que ainda não decidiu se vai participar da “disputa político-eleitoral”. Para garantir que haja essa possibilidade, caso tome decisão nesse sentido, optou pela filiação. Ex-procurador no Rio de Janeiro, ele foi presidente do Supremo entre novembro de 2012 e julho de 2014.
Embora o ex-ministro da Fazenda já tenha disputado e vencido uma eleição legislativa, sem chegar a exercer o mandato, ambos os nomes poderiam se encaixar no perfil de outsider – ou pelo menos dos que buscam distanciamento dos políticos tradicionais.
Segundo a cientista política Clarisse Gurgel, da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), no atual cenário, são candidaturas nessa linha as que têm mais chances de vitória na atual conjuntura.
“Os outsiders são os mais aptos a serem os candidatos do empresariado. São pessoas que não têm um passado político e são vistas como técnicos. Foi esta a imagem de presidente ideal que se forjou desde o desgaste iniciado no impeachment da Dilma até a prisão do Lula”, avalia.
A eventual candidatura do ex-presidente do STF, segundo a analista, poderia se situar no espectro de centro-direita e tem potencial também para angariar votos de seguidores do lulismo. Por sua trajetória de superação, haveria a possibilidade de alcançar aqueles que se identificam com o histórico do petista. Ao mesmo tempo, Gurgel enxerga em Barbosa características correspondentes a um imaginário que interessa aos setores à direita.
“Há um discurso na boca de quadros consagrados da direita que desautoriza os extremos, de Lula a Bolsonaro. Isso conduz o eleitorado a uma ideia de que o caminho é o da serenidade, do equilíbrio, com um candidato de centro. Ao mesmo tempo, precisa dialogar com aquilo que tocou os corações dos que não votam na direita: um ex-presidente nordestino que veio da pobreza preso e uma vereadora negra assassinada. Essas duas questões são conjugadas em uma candidatura negra, de centro, com perfil técnico”, argumenta.
Onde se posicionaria Barbosa?
O cientista político Geraldo Tadeu, professor no Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), enxerga uma possível candidatura de Joaquim Barbosa no campo de centro-esquerda. Entretanto, ressalta ainda não ser possível apontar de que forma o ex-ministro do STF se posicionaria em uma campanha presidencial.
“É uma incógnita. A gente não conhece as propostas, até porque o Barbosa não se assumiu como candidato até agora. Ele vem por um partido de esquerda e terá que envelopar suas ideias para conquistar a militância do partido. Mas deve assumir um perfil de centro-esquerda, junto com o Ciro Gomes. É o espaço a ser disputado nesse momento. A esquerda, no sentido estrito, é uma área ocupada e já em disputa, com Manuela D’Ávila (PCdoB), Guilherme Boulos (Psol) e um eventual candidato do PT”, analisa.
O cientista político enxerga em Barbosa um perfil similar ao do ex-presidente Lula, com a diferença da trajetória acadêmica do jurista. Entretanto, considera prematuro afirmar que votos do petista migrariam para o eventual candidato do PSB.
“O grande celeiro do Lula é o Nordeste, onde as intenções de voto dele vão a 58%. Lá, quem mais cresce com a saída do Lula é o Ciro, que tem sua base no Ceará, o segundo maior colégio eleitoral da região. Ele está mais bem posicionado para herdar os votos de Lula e tem maior cultura política. O outsider está mais ou menos sozinho. Não tem 27 candidatos a governador e outros 300 e tantos para deputado federal. Os mais experientes, com mais entrada, têm toda uma estrutura de apoio, palanques estaduais, que carregam a candidatura no momento da campanha”, diz.
Caminho difícil para Meirelles
Ambos os analistas ouvidos pela DW Brasil condicionam o sucesso eleitoral da candidatura de Meirelles à existência de um consenso no grupo político à frente do governo. Geraldo Tadeu, do Iuperj, crê numa confluência das candidaturas de Rodrigo Maia (DEM) e Paulo Rabello de Castro (PSC) para a do economista. Ele acredita que Meirelles vai destacar sua atuação individual no campo econômico, em vez de defender algum legado do governo Temer.
“Ele vai tentar se apresentar como candidato da modernidade, que tirou o país da recessão e vai colocar nos trilhos. Além disso, vai tentar caracterizar todos os outros candidatos como populistas. Banalizou-se o termo, e todos que não pensam exatamente como manda o mercado são taxados dessa forma. Não vejo densidade nas outras candidaturas do mesmo campo, e a tendência é que o MDB encampe seu nome. Ele não assinaria a ficha de filiação de graça”, afirma.
O especialista acrescenta que há espaço no eleitorado para assimilação do discurso tecnicista do ex-ministro. “Seria o discurso necessário para ele e tem chances de colar. Eleição depende de conjuntura, um fenômeno muito complexo. Vai depender do processo de saída da crise, recuperação do emprego. É oferta e demanda: cada candidato vai oferecer uma solução para as demandas do eleitor. Não dá para fazer um prognóstico fechado, mas sabe-se que há espaço para o discurso da racionalidade, eficiência, que tem muita adesão nas classes médias. A popularidade dele aumenta demais entre o eleitorado de maior renda”, opina.
A exatos seis meses da eleição presidencial deste ano, 15 nomes já se colocaram publicamente na disputa. Entre os grandes partidos, além de PSB e MDB, o PT, com Lula preso, ainda não definiu seu candidato.
De acordo com a legislação, os partidos políticos devem promover convenções nacionais com seus filiados entre 20 de julho e 5 de agosto para que oficializem as candidaturas. A data final para registro das candidaturas pelos partidos políticos na Justiça Eleitoral é 15 de agosto.
Fonte: Carta Capital