No domingo 28, o programa de Senor Abravanel, mais conhecido como Sílvio Santos, transmutou-se em instrumento de agitação e propaganda do governo ilegítimo de Michel Temer, convidado para defender, ao lado do proprietário do SBT, a reforma da previdência.
Após utilizar o seu “revólver da fortuna” para disparar cédulas de 10 e 50 reais em direção à plateia, premiada para aplaudir toda e qualquer asneira verbalizada pelo apresentador e para prestigiar todo e qualquer meliante convidado ao programa, Silvio Santos anunciou a presença de Michel Temer. Juntos, afirmaram aos telespectadores que a reforma é necessária para garantir o futuro da aposentadoria e que as novas regras propostas afetam apenas aqueles que ganham mais, poupando os mais pobres.
Silvio Santos encerrou a entrevista da seguinte maneira: “Se não aprovarmos a reforma da previdência, nós, daqui a dois, três, quatro anos, nós não vamos ter dinheiro para pagar aos aposentados. Essa é a verdade”.
Temer se despediu do programa à moda de Rodrigo Rocha Loures. Retirou uma cédula de 50 reais do bolso do paletó, com a qual presenteou Silvio Santos, sogro do deputado Fábio Faria, que por sua vez é filho do governador do Rio Grande Norte e vice-presidente do PSD, Robinson Faria.
O episódio é revelador da mediocridade da burguesia e da atual conjuntura nacional. Senor Abravanel construiu sua fortuna e popularidade transformando a pobreza em espetáculo. “Quem quer dinheiroooo?”, repete exaustivamente, enquanto a plateia disputa seus donativos.
Temer, por sua vez, chegou à Presidência da República por meio de um golpe. Não se comporta como um chefe de Estado. Ao presentear Silvio Santos com uma nota de 50 reais, buscou conquistar a simpatia do público do programa, mas terminou por revelar mais uma vez o modus operandi do governo ilegítimo. “Quem quer dinheiroooo?”, repete Temer exaustivamente aos deputados e senadores.
Assim se fez o golpe. Assim a emenda constitucional 95/16 foi aprovada e assim os direitos dos trabalhadores foram eliminados.
“Quem quer dinheiroooo?”, repete Temer aos proprietários dos principais veículos de mídia do País, ansiosos por conquistar a verba de publicidade do governo e por ver aprovadas as reformas neoliberais.
“Quem quer dinheiroooo?”, repete Temer ao Poder Judiciário, que se torna cada vez mais garantista dos seus próprios privilégios e dos privilégios da burguesia nativa, enquanto testemunha ativamente o sepultamento da Constituição de 1988 e da democracia.
Está em vigor um “grande acordo nacional”, conforme Sérgio Machado, “com o Supremo, com tudo”, de acordo com Romero Jucá. Não podemos nutrir ilusões. A burguesia só vai deixar de ser medíocre e de tratar os trabalhadores como lixo orgânico quando estes impuserem uma derrota estratégica, que conduza a classe trabalhadora não apenas ao governo, mas ao poder.
Os partidos que tiverem a verdadeira pretensão de mudar o curso da história necessitam reorientar sua estratégia e retomar a via revolucionária, o que significa abandonar a política de conciliação de classes e apostar cada vez mais na luta social, na educação popular, na formação política, na agitação e propaganda e nas organizações de base.
A estratégia não pode, porém, prescindir da leitura da realidade, o que nos permite entender o quanto é importante, na atual conjuntura brasileira, impedir que a burguesia interdite a maior liderança popular do campo democrático e popular: Luiz Inácio Lula da Silva.
A interdição de Lula é a próxima fase de um golpe que sequestrou a soberania do voto popular, impôs uma agenda de retrocessos econômicos e sociais à classe trabalhadora e que pretende, desavergonhadamente, eliminar qualquer possibilidade de vitória eleitoral de representantes dos trabalhadores, por mais socialdemocratas ou nacionalistas que possam vir a ser, descartando para tanto a legalidade.
O avanço do golpe com a interdição de Lula significaria, muito provavelmente, o início de um longo processo de hegemonia das classes dominantes. Hegemonia que pode vir a ser exercida inclusive com a mudança do sistema político, com o recrudescimento da criminalização dos movimentos populares, com a cassação dos registros de partidos de esquerda e com a censura ideológica, o que dificultaria ainda mais qualquer tentativa de reação popular.
Enquanto a burguesia tenta definir os destinos do País em gabinetes e tribunais de exceção, é preciso cada vez mais convicção de que o nosso lugar é nas marchas, paralisações, greves e ocupações, assim como nos centros de formação e nas redes de educação popular. Sempre é hora de sonhar, mas se faz imperativo organizar o sonho.
Por: Bruno da Costa Ferreira
Fonte: Carta Capital