A criação do Ministério da Segurança Pública, anunciada oficialmente pelo governo golpista de Michel Temer (MDB) nesta segunda-feira (26), foi criticada por especialistas que acompanham o tema no país.

A professora Cristiane Zackseski, do Núcleo de Estudos sobre Violência e Segurança (Nevis) da Universidade de Brasília (UnB), considera que a iniciativa não traduz exatamente um avanço no combate à criminalidade por parte do Estado.

“Não há necessidade de um ministério nessa área. Nós temos é que colocar em curso uma política verdadeira de segurança pública que tenha por base uma melhor conjugação de forças nessa área”, afirma.

Como exemplos de medidas consideradas mais efetivas para o controle da violência, ela cita, além da promoção de políticas sociais, a desmilitarização da polícia, o investimento em inteligência e a unificação das diferentes polícias, de forma a tornar mais eficiente o trabalho dos agentes.

A nova pasta deve aglutinar os comandos da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal (PRF), do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) e da Secretaria de Segurança Pública. Os quatro órgãos eram, até então, uma competência do Ministério da Justiça.

A novidade se dá em meio ao contexto de intervenção militar no Rio de Janeiro, iniciada na semana passada. O envio das tropas federais é defendido pelo governo como ação emergencial para frear a violência no estado. Somadas, a intervenção e a inauguração do Ministério são apontadas por opositores e especialistas como medida de caráter midiático.

Com forte apelo popular, as duas seriam, juntas, parte do plano de marketing de Temer, que tenta aumentar a popularidade para pleitear junto ao partido uma candidatura à Presidência da República.

Diante desse contexto, a novidade também encontra resistência entre quem atua na ponta do problema da violência. O tenente da Polícia Militar do Ceará Anderson Duarte, porta-voz da entidade Alip Brasil (Agentes da Lei contra a Proibição de Drogas), classificou a criação do Ministério como uma “medida populista”.

“Quando tomamos conhecimento, sequer veio a esperança de mudanças. Apenas um grande ceticismo. Do ponto de vista da redução da violência, é uma medida inócua”, disse.

A ONG Instituto Sou da Paz, que nos últimos anos defendeu a criação do ministério como ponto de uma agenda prioritária para a segurança, também acredita que, neste momento, a medida não deve surtir o efeito prometido, como afirma o diretor-executivo da entidade, Ivan Marques.

Ele aponta como problemas a falta de orçamento e a incapacidade de garantir as políticas necessárias à área, como a criação de uma escola nacional de formação para polícias e a padronização das estatísticas de segurança pública. Essa última é considerada essencial para a elaboração de estudos e diagnósticos mais precisos sobre a problemática da violência.

“Me parece que um ministério criado neste momento tende a esvaziar os trabalhos do Ministério da Justiça e começar uma estrutura sem muita musculatura”, avalia.

Realocação

Para o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, a realocação de alguns dos órgãos que ficarão a cargo do novo ministério pode prejudicar as responsabilidades originais dessas subpastas do ponto de vista técnico.

Ele menciona, por exemplo, que o trato com o Judiciário, tradicionalmente a cargo do Ministério da Justiça, não pode ser divorciado da política penitenciária. Por conta disso, na maioria dos estados da Federação, essa competência é atribuída às Secretarias de Justiça, e não às de Segurança Pública.

“Alguns temas têm que ser tratados de forma inter-relacionada pra que realmente possam prosperar. A localização do tema penitenciário na Secretaria de Segurança Pública ou no Ministério da Segurança é uma excrescência, um completo desvirtuamento desse tema”, critica.

Ministro

A nova pasta terá à frente o atual titular do Ministério da Defesa, Raul Jungmann. O general Joaquim Silva e Luna, atual secretário-executivo da Defesa, deverá assumir interinamente no lugar dele.

Filiado ao PPS, Jungmann foi um dos articuladores políticos do golpe que depôs a presidenta Dilma Rousseff (PT), em 2016, quando era deputado deputado federal e vice-líder da minoria na Câmara dos Deputados, então oposição ao governo petista.

Entre outras coisas, o novo ministro atuou também como um dos articuladores da suspensão da posse do ex-presidente Lula (PT) como ministro da Casa Civil, em 2016, quando Dilma quis nomeá-lo para o cargo.

Fonte: Brasil de Fato