A nova Lei n. 13.103/2015 dos motoristas profissionais, ou seja motoristas devidamente habilitados perante a autoridade de trânsito e que transportam cargas e passageiros pelas vias (urbanas e rurais) e rodovias, inclusive os trabalhadores componentes da categoria profissional diferenciada), sucede a antiga Lei n. 12.619/2012. Esta alteração é fruto da pressão derivada da greve geral dos caminhoneiros autônomos e dos interesses do agronegócio, ocorrida em fevereiro/2015.

A Legislação especifica para a categoria dos motoristas trouxe profundas alterações, tanto a CLT, no capítulo das normas especiais de tutela do trabalho, na sua seção IV-A – Do serviço do motorista profissional, aplicável aos trabalhadores submetidos ao contrato de trabalho – e também no CTB, que sofreram mudanças e adaptações no conteúdo normativo, agora, definido pela lei 13103/2015.

Apesar da NOVA LEI DO MOTORISTA, ter mantido a essência principal da necessidade do controle da jornada dos motoristas, destacamos os seguintes pontos polêmicos e de flagrante retrocesso: a) gestão do tempo de trabalho do motorista: incorpora-se a legitimação da jornada extenuante, para tanto, autoriza-se a possibilidade de elastecimento da jornada para até 4 (quatro) horas extraordinárias, mediante acordo ou convenção coletiva (art.235-C da CLT;), além de manter as flexibilizações já existentes na 12619/12 (extensão do tempo de jornada por conta de força maior – art. 235-D, §6º, de transporte de carga (animais vivos e perecíveis) em condições especiais – art. 235-D, §8º; implantação da jornada 12×36 mediante negociação coletiva – art. 235-F); jornada móvel flexível, ou seja sem horário fixo para início, término ou intervalos (art. 235-C §13º) na lei antiga como em texto normativo, b.) tempo de espera – definido como tempo no qual o empregado ficar aguardando carga ou descarga do veículo nas dependências do embarcador/destinatário ou de fiscalização da mercadoria transportada em barreiras fiscais ou alfandegárias, não sendo computados como jornada de trabalho e nem como horas extraordinárias, noutras palavras caso o empregado esteja na execução da sua jornada e se defrontar com uma dessas situações, teremos a interrupção da jornada e o ingresso no “mundo jurídico” do tempo de espera (art. 235-C § 8º); nessa hipótese sua remuneração foi reduzida para 30% (trinta por cento) do valor da hora normal e com caráter meramente indenizatório, ou seja sem natureza salarial, ao contrario da lei 12619/2012 que adicionava 30% ao valor da hora/normal, adotando-se uma espécie de remuneração de sobreaviso (art. 235-C § 9º). Contudo não afastam o empregado da obrigação acessória do seu contrato, qual seja, a vigilância e o acompanhamento da operação logística/fiscalização. Denota-se a “preciosidade” do texto é a possibilidade de trabalho sem remuneração, prevista na hipótese de realizar movimentações necessárias do veículo (filas em portos ou grandes embarcadores por ex.), as quais “não serão consideradas como parte da jornada de trabalho” (art. 235-C § 12º). O texto legal tenta atenuar o absurdo, quando ressalva (art. 235-C § 10º), garantindo remuneração mínima condizente ao dia de trabalho; c) períodos de intervalo para refeição, repouso, descanso e direção (art. 235-C § 1º) – múltiplas e complexas possibilidades de desmembramento, cumulação, fracionamento e compensação dos referidos intervalos (art. 235-C § 2º, 3º,12º.; art. 235-D § 1º, 2º.; art. 235-E – inc. I e II), além da extensiva gama de possibilidades quanto ao local e condições de usufruir o gozo dos referidos intervalos (art. 235-C § 4º,11º.; art. 235-D § 4º, 5º.; art. 235-E – inc. III); d) comissionamento – se antes a legislação era restritiva a essa forma de remuneração do trabalho do motorista, agora, pelo contrário estimula-se o sistema de remuneração variável pela distância percorrida, do tempo de viagem ou da natureza e quantidade de produtos transportados (art. 235-G).

A referida lei, ao impor condições inóspitas e jornadas extenuantes, expõe não só os motoristas, mas todos os demais usuários de vias e rodovias. Os retrocessos e flexibilizações inseridos na lei desafiam os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da valorização do trabalho humano, além de conter claras inconstitucionalidades. Não se justifica o desmonte de uma legislação anterior existente, que sequer estava assimilada integralmente por empregadores, trabalhadores e sindicatos.

Infelizmente, a nova forma legal da gestão do tempo de trabalho, do não trabalho e da remuneração acentuarão, certamente, os níveis de acidentes de trânsito que tanto matam, afastam e mutilam os brasileiros!

Sandro Lunard Nicoladeli – advogado, doutorando em Direito e professor de prática trabalhista e Direito do Trabalho da Universidade Federal do Paraná.

André Passos – advogado trabalhista, consultor de entidades sindicais e presidente da Comissão da Direito Sindical da OAB/PR.

Fonte: Blog do Tarso