Algumas mentiras repetidas à exaustão acabam se transformando em verdades consentidas. É o que acontece com o tema da previdência social, em que se ventilam por aí como certezas informações que são comprovadamente falsas. Desconstruir estes mitos através de números, pesquisas e dados históricos foi um dos méritos do primeiro dia do Seminário Nacional: Reforma da Previdência, Saúde e Terceirização, que começou nesta quinta-feira (19), em São Paulo, promovido pela CTB. 

Com muita competência e profissionalismo, especialistas no assunto prestaram um enorme serviço a dirigentes sindicais e à classe trabalhadora, em geral, ao desmontar alguns mitos, e mostrar que o alardeado déficit da previdência é uma falácia – o que ocorre é desvio de recursos para outras finalidades; e que a reforma da previdência não vai ajudar no ajuste fiscal – o ajuste é para já, há urgência, enquanto que o impacto dos cortes na previdência leva 20 ou 30 anos para ser sentido.

Ou seja, o desmonte dos direitos é uma retórica largamente adotada pelos governos neoliberais para privilegiar a classe empresarial em detrimento dos trabalhadores, invariavelmente a parte mais vulnerável do processo. Como destacou Daisson Portanova, advogado e consultor em matéria previdenciária e de direito social, o seminário vai muito além de buscar uma solução para a reforma.

“Temos de ter uma formação no assunto para fazer o enfrentamento desta reforma. Exatamente para não tomar bola nas costas. Para quando o governo disser que isto é assim, nós tenhamos condições de responder e provar que isso não é verdade. Esta capacidade de negociação é que pode mudar o rumo das coisas”, diz Portanova. 

Décio Bruno Lopes, vice-presidente de Assuntos da Seguridade Social da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal, destacou justamente isso: o grande desconhecimento que há entre a maioria das pessoas sobre o Direito Previdenciário, que nada mais é do que uma rede de proteção social importantíssima a todos os brasileiros.

Para Lopes, uma pauta importante a ser defendida também pelas centrais sindicais é a transformação da Previdência em política de estado e não de governo. “Desde João Figueiredo, nos anos 80, a reforma previdenciária é debate em todos os governos brasileiros. E não é algo que possa mudar todo ano. Precisa ter uma legislação perene, para que possa existir planejamento.” 

O desvio de finalidade nos recursos da Previdência, segundo Lopes, começou no governo de Fernando Henrique Cardoso com a criação da Desvinculação das Receitas da União (DRU), instrumento que permite a retirada de até 20% dos recursos da pasta para outras despesas do governo. A DRU é citada por Lopes como uma das ameaças que pairam sobre a Previdência Social, ao lado da possibilidade de terceirização ilimitada, projeto defendido pelo governo, e do aumento do desemprego.

“A Previdência é o maior sistema de distribuição de renda do estado brasileiro.Em 70% dos municípios é esta arrecadação que faz girar a economia da cidade”, diz Lopes. No entanto, o discurso corrente na grande imprensa e dos porta-vozes da economia sempre destaca o caráter negativo da previdência e o risco de eminente quebra do sistema.

“Criou-se um monstro para assustar as pessoas. Vai quebrar! É o que se diz. E para prevenir o desastre aparecem soluções miraculosas e sempre segmentadas. Ninguém quer discutir o custeio, a entrada dos recursos, que é onde reside o problema maior”, diz a doutora em direito previdenciário e presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, Jane Lucia Berwanger. 

O seminário é promovido por três secretarias da CTB, a de Formação e Cultura, da Saúde do Trabalhador e da Previdência, lideradas, respectivamente, por Celina Arêas, Elgiane Lago e Pascoal Carneiro. Nesta sexta-feira (20), os temas em debate são a terceirização de serviços, com a participação do senador Paulo Paim, e a Seguridade Social no Brasil, com a participação do presidente do Conselho Nacional de Saúde, Ronald Ferreira dos Santos.

 

Fonte: CTB