Quando iremos acordar e perceber a manipulação reacionária da agenda nacional?
 

Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência BrasilUma arapuca para as esquerdas

Uma parte da esquerda brasileira tem sua agenda pautada por uma direita reacionária e ultraconservadora que por conseguinte possui raízes nas relações de poder aristocráticas escravistas e feudais.

Entretanto, esse ultraconservadorismo não “ressurge das cinzas” por acaso. Ele é planejado, motivado por uma nova forma de imperialismo  e seu braço ideológico, ou seja, as concepções neoliberais.

A vertente dominante do imperialismo atual, o grande capital financeiro, incentiva ao mesmo tempo o ressurgimento das abafadas vozes de uma velha guarda ultraconservadora e dos puritanos (militares da reserva, audosos da ditadura, rentistas enfraquecidos e outros) com as novas lideranças políticas e econômicas surgidas num ambiente ideológico neoliberal (do empreendedor schumpeteriano e da meritocracia, como se o ambiente social e o Estado não fossem indutores do sucesso individual), do individualismo e tantas outras formas ideológicas difundidas pelas igrejas e pela mídia.

Leia também:
O estado de exceção como forma institucional do ódio

Os agentes do imperialismo capitalista financiam um componente primordial nesse jogo de forças. As lideranças juvenis de classe média e média-alta conseguem arrebanhar uma multidão de jovens alienados (originados sobretudo de um sistema educacional precário e acrítico) e sem muita esperança no futuro.

Essas lideranças jovens – enriquecidas, com sua atuação política dissuasiva e financiadas pelo imperialismo, por meio de ONGs, associações etc. – objetivam claramente desestabilizar governos e forças de esquerda, atuando sobremaneira nos movimentos estudantis secundaristas e universitários.

Estes grupos possuem um único objetivo: pautar os caminhos da esquerda. Essa arapuca dá certo, redundando numa polarização dominada por discursos racistas, homofóbicos, machistas, preconceitos de toda ordem e, em certa medida, acaba em assassinatos políticos.

Ao mesmo tempo incidem o discurso de eficiência e moralidade pública que objetiva o falso fim da corrupção. Falso na medida em que os maiores difusores dos discursos de ódio e moralidade pública estão envolvidos em grandes escândalos.

Essa é a armadilha montada para grande parte da esquerda brasileira. Ela tem como objetivo direcionar o campo de luta da esquerda e especialmente pautar seu campo de luta, afastando a mesma das questões macroeconômicas (um projeto nacional-desenvolvimentista) e de soberania nacional.

Mas todas essas pautas, apesar de importantes e combatidas (devido a seus argumentos repugnantes levantados pelos grupos ultraconservadores), são uma cortina de fumaça. Uma distração que leva grande parte da esquerda para uma discussão ideológica no âmbito da superestrutura. “Se queres prever o futuro, estuda o passado”, dizia Confúcio.

Ao tratar da superestrutura, a esquerda brasileira distrai-se e abandona a essência das grandes questões nacionais, ou seja, aquelas no âmbito da infraestrutura e que interessam ao imperialismo.

Quais são estas questões? Os elementos primordiais da nossa macroeconomia nacional, como as privatizações e concessões de serviços públicos à iniciativa privada, a ampliação do exército industrial de reserva, a diminuição dos salários, a flexibilização da legislação trabalhista, o aumento da jornada de trabalho, o fim de um sistema previdenciário público e a transferência para um regime privado repleto de riscos e falcatruas, a diminuição da assistência social, o aumento do desemprego, a baixa do PIB.

Além destas, a geoeconomia mundial e a geopolítica global, como a formação dos BRICS, a liderança do Brasil na América Latina, a soberania sobre o pré-sal e os investimentos decorrentes dele em educação e saúde, ampliação do comércio e das relações internacionais do Brasil.

E ainda o avanço imperialista, com seu interesse na expansão dos ganhos financeiros dos Estados Unidos em detrimento das suas perdas produtivas e de inovação e sua resistência a uma contra hegemonia na qual o Brasil estava em processo de aproximação, isto é, a China.

Por fim, o neoliberalismo e as bases políticas para uma maior ampliação da financeirização da economia, com a manutenção do dólar como principal moeda de trocas internacionais e todos os elementos de coerção extra-econômicas possíveis para ampliar as bases comerciais globais de circulação do capital em prol do império e seus associados.

Portanto, a prisão de Lula faz parte de toda essa orquestração. Personagens como juízes, militares, rentistas, grupos de mídia e outros são agentes internos associados a essa lógica imperialista. Historicamente cooptados, fazem o jogo do império e entregam a soberania nacional por algumas migalhas.

Muitos outros personagens não passam de “bobos da corte” em busca dos restos jogados aos cães pelo “rei”. Estão nessa categoria o pobre de direita e uma parcela significativa da classe média. Ludibriados, mas convenientemente na batalha das elites econômicas e políticas nacionais e internacionais.

São mercenários empobrecidos ou típicas “buchas de canhão”, na frente da batalha, para receber os primeiros tiros. As “buchas de canhão” integram a nossa história colonial, imperial e republicana.

A esperança é que parte desses grupos denominados aqui de “bobos da corte” começaram a acordar e percebem a sua utilidade funcional para um sistema falido e que, por conseguinte, também irá oprimi-los.

A questão é quanto tempo demorará para acordarmos? Será que perceberemos a essência dos fatos em vez de sua mera aparência? Antes tarde do que nunca? E esse tardar virá com mudanças demoradas, de cima para baixo, realizadas pela burguesia, uma mera revolução passiva, ou enfrentaremos uma verdadeira revolução?

Para essa última as perspectivas históricas estão confusas e muito pouco latentes.

Fonte: Carta Capital